O útimo dia útil da semana é sempre estranho. No escritório, eu fico conversando com a Rachel no messenger, jogando Jellybattle, assistindo vídeos no youtube e lendo noticias no Terra o dia todo enquanto faço caras sérias e pensativas na frente da tela do notebook fingindo estar trabalhando - é muito bom estar em uma posição privilegiada na sala, sem ninguém vendo diretamente o que você está fazendo.
E então dá 18h e eu parto finalmente para o lugar que salva meus dias. O curso técnico no Aristóteles: eu realmente me divirto lá, com as pessoas, os comentarios engraçadinhos, o intervalo (que ultimamente tenho passado lendo meu Watchmen Edição Luxo na classe acompanhado de uma coxinha e um café duplo), mas principalmente da matéria dada. Eu realmente estou gostando deste curso, mas isso é assunto pra outro lugar.
Acontece que na sexta, parece que escolheram as matérias mais dispensáveis. AutoCAD (que eu já tenho cursado) e Português. Francamente... é complicado. Mas eu tenho que ir, fazer o que?
Saindo de lá, por volta de 22h30, vou até a casa da Rachel que fica no caminho, fico uns vinte minutos ali colocando o namoro em dia e então parto pra casa feliz pra jogar um pouco de Temple of Elemental Evil comendo alguma porcaria antes de cair na cama e acordar em pleno 12h de sábado.
Hoje não foi bem assim.
Hoje aconteceu algo que me fez criar este blog.
Bem, não necessariamente HOJE. Coisas assim, como as de hoje, acontecem quase sempre. Pra pessoas como eu, "ciclistas diários", têm histórias e mais histórias pra contar. O evento de hoje me fez, de repente, pensar em como eu tenho histórias! Elas preciam ser contadas/relatadas/documentadas em algum lugar. Pois bem, eu tinha um blog que era atualizado frequentemente mas resolvi parar por uns motivos antigos. Mudei o endereço dele e agora este aqui tomou seu lugar... pra ficar!
Sem mais delongas - até porque o título deste blog é auto-explicativo (não vou me preocupar com as novas regras de ortografia, eu sei que "auto-explicativo" deve ter sofrido alguma alteração (ou não), não me importo), vou relatar o que aconteceu.
Saí da casa da Rachel por volta de 00h. O trajeto é: Alexandre Martins, Pedro Lessa até o fim até chegar no Canal 4 e entrar na rua que eu e meus amigos (The Party) apelidamos de Vale-da-sombra-da-morte-onde-não-temerei-mal-algum.
É uma rua assustadora tanto de dia quanto de noite. Mão única, tem 340 metros (acabei de medir no Google Earth), só tem saídas para a direita e é parcialmente coberta por árvores sexagenárias. O asfalto precário e as casas antigas ao longo da rua deixam ela com um ar mais macabro ainda. A noite, a iluminação é quase zero.
Por incrível que pareça, é uma rota inevitável. Se eu não passo por esta rua, eu acabo fazendo um caminho muito mais longo... e nessa hora da noite, caminhos longos é o que eu menos quero.
Eu nunca tinha passado por nada grave nesta rua a não ser as finas que os carros tiram de mim, eles passam a menos de 15 centimetros a mais de 60 Km/h. Eu os perdoo pois acredito que eles estão temendo por suas vidas ao passar por esta rua a essa hora da noite, por isso o desespero. Ou não.
Certo, então estou eu e a Eorlingas em pleno Vale-da-sombra-da-morte-onde-não-temerei-mal-algum às 00h15 de uma sexta a noite. Deserto. Nenhum som. Nenhuma pessoa. Nenhum movimento.
De repente, gritos. Gritos mesmo! Urros desfigurados como uma multidão em uma fúria bárbara anárquica! Assustado, olho pra trás instintivamente... tudo o que vejo são faróis muito fortes que ofuscam minha visão. Eu cambaleio e passo em cima de um paralelepípedo e quase caio (nota mental: preciso checar o Pneu da Eorlingas pra ver se não está avariado).
De inicio, imaginei que os gritos viessem do carro, ué, normal... fim de semana, universitários de mente vazia indo pra balada... tudo bem. O carro passa por mim e eu vejo de relance três pessoas bem quietas e aparentemente normais dentro do carro. Ok, não foram elas. Volto a olhar pra trás, dessa vez com o pressentindo o pior.
Vejo uma multidão de bicicletas. Tá, nem tanto, umas cinco. Nas cinco bicicletas, em menos de um segundo consegui enxergar pelo menos umas sete pessoas. Todas elas gritavam feio loucas como se chamando alguem, querendo chamar atenção. Só tinha eu ali. Neste momento, eu expressei a única palavra que me veio na mente: FUCK! - Eu realmente falei "fuck", de vez em quando me dá uns espasmos e eu acabo falando algo em inglês inconscientemente (geralmente pra expressar raiva ou espanto, na maioria das vezes é pra xingar alguem em tom baixo).
Sons de estalos, minha mão automaticamente engata a marcha pesada da Eorlingas enquanto ao mesmo tempo eu passo a pedalar de pé, sentindo a catraca mudar bruscamente da 7ª pra 18ª marcha.
E então o espirito de um guepardo baixou em mim.
O animal terrestre mais rápido do planeta se apossou de meu corpo e eu fui de 0 a 100 Km/h em 3 segundos.
Enquanto sentia o vento bater violentamente no meu rosto e desviava dos buracos no asfalto, ouvia os gritos atrás de mim se intensificarem. Dei uma ultima olhada pra trás antes de sair do Vale-da-sombra-da-morte-onde-não-temerei-mal-algum e entrar à direita na Oswaldo Cruz, vi eles apertando o passo e uns três tomando a dianteira.
"Merda, merda!!"
Com um esforço sobrehumano aumentei ainda mais a velocidade da Eorlingas e atravessei imprudentemente a Oswaldo Cruz da direita pra esquerda, sem nem ver se vinha algum carro.
Em 2 segundos eu calculei: Eu três opções, seguir reto pela Oswaldo Cruz até a Afonso Pena e eles me seguirem até lá... virar à direita na rua do Danilo (mudar totalmente minha trajetória) e tentar enganá-los ou me ferrar dando de cara com eles, pois eles teriam cortado caminho pra chegar ali, já que me viram virando à direita uma quadra à frente deles, ou virar à esquerda e chegar à Conselheiro Nébias. A terceira opção me pareceu a mais viável, pois assim eles me perderiam de vista rapidamente. Então atravessei imprudentemente a rua e entrei na ruazinha que dá na Conselheiro.
Neste momento, eu estava esgotado.
Eu nunca tinha dado um sprint como esse. Nunca tinha explorado dessa forma a marcha pesada da Eorlingas, eu sabia que era muito rápida, mas não imaginava ser tanto... Eu estava dolorido... morto... mas consegui despistá-los - ou eles desistiram perante a velocidade da Eorlingas.
Parei por uns 30 segundos no barzinho universitário com pessoas sem mente rindo e bebendo, falando de pessoas e big brother pra respirar e me certificar que não estava mais sendo seguido.
Engatei a 4ª marcha e fui lento, muito lento até em casa, 1,200m (viva o Google Earth).
Isso é um acontecimento normal. Só nunca aconteceu ali.
Já aconteceram até piores.
Mas nunca fui "pego". A Eorlingas sempre me salva. Vou contar progressivamente esses causos.
No fim, sempre consigo chegar até o prédio, mesmo esbaforido, e dar boa noite pro Manoel, o vigia.
21 de março de 2009
Espirito de Guepardo
Relatado por Marcio às 2:02 AM
3 comentários:
Hail Marcio, Bike Master
Os Nazgûl apareceram atrás de ti e vc deu o comando em élfico para o Eorlingas (FUCK!) e ele saiu em disparada hahahahah!
Ficou demais o blog cara!!! Excelente idéia!
Abraços e cuidado com o vale-da-sombra-da-morte-onde-não-temerei-mal-algum...
Danilo
Tadinho amor. =/
Toda vez que você vai embora da minha casa, eu fico com o coração na mão, até você me ligar pra dizer que está tudo bem, juntamente com a Eorlingas.
Cuidado!
Existe alguma dúvida da periculosidade deste vale?
A morte espreita essa região.
Louvada seja Eorlingas e suas 45 marchas, das velocidades "fusca de velho" até "guepardo em fuga".
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